Guia prático pra iniciantes em 007 (parte 2)
No último artigo vimos um resumo de metade da história da franquia 007, praticamente toda a era clássica do espião, vimos que a fase Connery era a mais clássica, com um Bond mais grilado e pé no chão, com aventuras densas fortemente inspiradas pela guerra fria, já Roger Moore era o Bond farofa pra toda a família, com muito humor e escapismo, puxando pra fantasia e Sci Fi, fazendo os produtores só perceberem que tinham ido longe demais quando Bond tinha ido PRO ESPAÇO… já o Lazenby… é, bem, é o Lazenby, ficou no meio disso só com um filme e não deixou muito sua marca, mas deu sorte de seu filme ser bom o bastante para ser reverenciado até hoje e seus eventos serem uma das poucas coisas “canônicas” em uma franquia que se preocupava pouco ou nada com continuidade.
“tô véio demais pra isso”
O Fim da era clássica e a transição pra era moderna
Como falei no artigo anterior, Roger Moore já começou velho (10 anos depois do planejado, já que ele estava cotado pra Dr. No na mesma época que Conney) mas mesmo assim foi o ator que passou mais tempo no papel, seu carisma por si só segurava os filmes pra compensar sua falta de vitalidade que sumia gradativamente a cada nova aventura, fora que era cômodo pra EoN (empresa da família Broccoli e detentora dos direitos) continuar segurando Moore o quanto desse porquê apostar em uma cara nova era sempre um risco, especialmente em 83 quando houve uma “guerra de Bonds” no cinema, com o RETORNO DE SEAN CONNERY para um filme não canônico (muita treta com direito autoral, explicarei na parte 3) não iam botar um novato pra enfrentar o clássico!
“voltei mermo Moore e tô mais enxuto que vc”
O resultado foi um Bond visivelmente acabado que fez pelo menos uns 3 filmes a mais do que deveria, pra piorar as histórias continuavam forçando a barra de que o véio podia esquiar, nadar, fazer montanhismo, isso ficava ainda mais acentuado se comparado com o filme bastardo de Connery em que a trama fazia abertamente piadas com a velhice de seu Bond, sendo que Connery era até MAIS JOVEM que Moore.
Mesmo com as alfinetadas, a Despedida definitiva mesmo só viria em “Na Mira dos Assassinos” de 85 em que Moore já estava com 58 anos, um filme que tinha bem mais a cara dos anos 80 (mais movimentado e violento) mas com um 007 deslocado que já não acompanhava mais esse pique… chegaram à um consenso quando tanto a EoN percebeu que um Bond Sexagenário não teria mais apelo, como tbm o próprio Moore caiu a ficha quando num encontro dos atores pra divulgação, ele notou que a MÃE da Bondgirl de View to a Kill era mais NOVA QUE ELE…
Primeiro e último filme
Olha esse baile da terceira idade mano, a Moneypenny tá parecendo a Bruxa do 71
Então decidido: aposentaram Moore, logo, a busca pelo novo 007 começou e o ator escolhido para a tarefa obviamente só poderia ser
PIERCE BROSNAN! claro!
Brosnan fazendo cosplay de pescador parrudo
perai, não, mas não foi isso que aconteceu!
Bom, é que Brosnan nos anos 80 estava enrolado com uma série de TV, e ATÉ poderia conciliar as duas coisas, mas como a EoN era estrelinha e não tava afim de dividir atenção com NINGUÉM, cortou Brosnan (por enquanto) e chamou o segundo da lista:
Era Dalton
1987 e 1989
(dois filmes)
The Living Daylights , Licence to Kill
Timothy Dalton é o primeiro Bond da era moderna, seus filmes em retrospectiva são os primeiros a não soar datados e ainda funcionam perfeitamente dentro de uma noção mais atual de cinema de ação, são o rompimento final com a pegada galhofa e despretensiosa de Moore, assumindo um caminho bem mais violento e verossímil.
Ainda que sinais dessa mudança de ares já se apresentassem nos últimos filmes de Moore, e no primeiro filme de Dalton ainda tenha sobrado uma ressaca de humor pastelão e umas viagenzinhas na maionese pontuais, não é tendencioso dizer que a chegada de Dalton é de fato um ponto de ruptura, e o estilo assumido visava ser o oposto do que tentaram até ali, e de fato, o resultado mostra que conseguiram essa quebra (se isto agradou ou não num primeiro momento, aí já são outros 500)
saudade desses pôsteres desenhados à mão
Daton é ator Shakespeariano, e grande fã da franquia, ele tinha uma ideia bem específica de como apresentar sua versão do personagem, dizer que ele era só mais um Bond frio e calculista é ser um tanto reducionista, seria tipo insinuar que Dalton só copiava Connery e por sua vez só serviu de base pro Craig copiá-lo (se bem que essa segunda é… meio verdade).
Mas Dalton não era só o retorno ao 007 brucutu original que matava só pra ver o tombo, ele era um tanto mais complexo que isto, era um Bond mais humanizado, rebelde, em ambos os filmes ele questiona violentamente a hierarquia, fazia as coisas ao seu modo quando sabia que estava certo ou sem tempo pra acatar ordens, não tinha medo de desafiar o auto comando, nem de ser chutado do MI6, e apesar de não ter sido o primeiro a fazer isto (desculpa Dalton esse mérito PASME, foi do Lazenby!) foi o primeiro a SE DEMITIR PRA VALER na primeira divergência mais séria com M!
mas em oposição à isso, foi também um Bond mais sentimental, foi em sua era que pudemos ver pela primeira vez em anos Bond aos prantos e desesperado por ver alguém que ele gosta morto ou ferido gravimente.
As vezes ele tinha esse olhar de quem só queria um abraço
Bond de Dalton não era só um Bond que poderia chorar, mas também era um personagem falível, que se machucava, sujava o terno, e talvez essa vulnerabilidade era justamente o que o distanciava de Connery, já que este ainda que tbm outro Bond sério e violento, ainda era um tanto “invencível”
Por último é também talvez o Bond mais tímido e menos pegador, já li que talvez por conta da explosão de AIDS nos anos 80 eles resolveram maneirar nas cenas sexuais, ou talvez por mesclar algo da personalidade reservada do próprio ator, o fato é que Bond se relaciona basicamente só com a Bond Girl respectiva do filme e uma outra no máximo, o que pessoalmente eu curto, não chega a ser um Bond “RESPEITADOR DE CASADAS” mas ainda é um gentleman (e é melhor que ver as cenas cringe de sexo geriátrico do Roger Moore)
“bom… fora das câmeras era outra história, chora seus virgi”
falando um pouco dos filmes já que são apenas 2: o primeiro (Marcado para a Morte) é o retorno à espionagem clássica com influencia da guerra fria,
Na trama dois generais russos trambiqueiros se aproveitam da raivinha do ocidente com a União Soviética, posam de desertores amiguinhos e manipulam o MI6 pra mandar Bond assassinar um desafeto de ambos, mas Bond sente o cheiro de coisa errada a distância e resolve averiguar ignorando as ordens superiores, bom filme, só peca por uma ou outra recaída nos exageros da era Moore (como uma cena em que ele corta uma viatura de polícia ao meio com um laser!) e nos vilões que não são nada marcantes nem ameaçadores (e por vezes são até meio cômicos, de novo o fantasma da Era Moore aí!) mas é um ótimo thriller de conspiração e levanta muito a bola do Bond de Dalton mostrando ele como o único que consegue enxergar as tramoias e não ser manipulado.
no segundo, um antigo colaborador e amigo de várias aventuras (Felix Leiter) é gravemente ferido por um cartel de Drogas (colocam ele num tanque de tubarões que lhe comem uma das pernas) mas Bond é impedido de poder agir por estar envolvido emocionalmente (e por ser da jurisdição dos americanos), dai ele toca o foda-se, pede demissão e sai louco enfrentando deus e o mundo pra dar fim no genérico de Pablo Escobar
primeiro filme do Murilo Benício, quer dizer, Guilhermo Del Toro
Este segundo filme já é bem mais decidido em seus rumos (“mais Dalton” vamos dizer assim) um filme bem mais brutal, talvez o mais violento da franquia até então, e ainda supre a ausência de um bom vilão do filme anterior com a figura de Sanchez, um Narcotraficante sul-americano realmente cruel e sanguinário, um vilão de gelar a espinha.
“vendo droga, mato, e aterrorizo os Goonies”
Pontos negativos:
difícil, Dalton é meu Bond favorito e acho realmente pouca coisa desagradável mesmo em filmes que já tem praticamente a minha idade, acredito que envelheceram bem… mas se fosse forçar um apontamento: os generais vilões do primeiro filme que são bem fraquinhos como eu já falei, e talvez (digo TALVEZ) eu entenda os motivos do Floppy de “Permissão para Matar” nas bilheterias, já que a uma primeira vista a trama de vingança e cartéis de drogas parecesse um tanto genérica pros anos 80, mas pra isso ser realmente um defeito, precisaria lembrar que a franquia SEMPRE seguiu a tendência do mercado, e seria o mesmo que reclamar da era Craig chupinhar a ação realista e cheia de Parkour dos filmes da série Bourne, é aquele tipo de demérito que vc SABE que tá lá, mas ignora se o filme for bom, e esse é definitivamente o caso de Permissão.. é um dos melhores e mais subestimados filmes de James Bond (tentei criticar, mas acabei elogiando de novo, não teve jeito)
Pierce Bronsan (agora sim)
1995 – 2002
4 filmes
GoldenEye, Tomorrow Never Dies, The World Is Not Enough, Die Another Day
Ainda que “Permissão Para Matar” tenha sido um dos melhores filmes de 007, o tom mais violento e brutal não agradou tanto a fanbase (povo burro do carai) então 007 ficou na geladeira uns anos até decidirem o que fazer, nesse período de “não-caga-nem-desocupa-a-moita” tanto Dalton quanto a EoN foram desanimando e ambas as partes desistiram de fazer um terceiro 007 juntos, o que abriu caminho para o outrora primeira opção da empresa: Pierce Bronsan
Cena inesqucível do filme Goldeneye
Brosnan já começa de forma arrebatadora com um filme celebrado até hoje: 007 Conta Goldeneye (e não, o mérito desse filme não está só no jogo clássico de Nintendo 64, o filme é bom mesmo sozinho) o que deu tanta moral pra ele que após 20 anos ainda é um Bond lembrado com carinho pelos fãs, ainda que todas as sequências dele tenham ficado entre medíocre e RUIM (fico pensando o que teria acontecido se o DALTON tivesse feito Goldeneye)
Mas sem veneno, eu adoro o Brosnan, é um ator excelente e de imenso carisma compensando a farofada que os filmes dele acabaram virando (e vc já deve ter notado um padrão aí nas eras né? parece que sempre ficamos alternando entre Bond Sério e Bond Farofa, e se o sucessor de Craig não quebrar essa regra, lá vem outro Bond galhofa aí) a Era Brosnan não chega a entregar as macacadas e bizarrices de uma era Moore, mas ela acaba abraçando outro tipo de cinema escapista: o “massavéio”!
Se Roger Moore estava mais próximo do Batman de 66, ou de filmes dos trabalhões, Bronsan se aproxima mais dos maneirismos dos anos 2000, ação exagerada, mirabolante e pouco (ou nada) plausível, muito uso de CG pra criar sequências que só um adolescente assiste de boa sem questionar como um ser humano comum tá fazendo aquilo! seus filmes são aquele tipo que a molecada adora, mas se seu tio passar na frente da TV vai dizer: “putz, mas que mentirada!”
Não é dublê, Brosnan é tão louco que pulou mesmo, e sem corda (a corda ai é CGI)
e tá aqui a prova:
Bond de Brosnan volta a ser um super herói infalível, abraça um novo tipo de breguíce, ainda que mantendo o charme e o glamour de outrora, o mais próximo que consigo imaginar de comparativo seriam os filmes da franquia Velozes e Furiosos ou os filmes da Marvel, e levando em conta que vieram depois, ainda que esse maneirismo tivesse uma base em produções típicas dos anos 90, acredito que pro bem ou pro mal, pela primeira vez em décadas 007 lançou tendência em vez de só copiar!
Seus filmes acabam sendo uma mistura de tudo que deu certo, mas na medida, o que pra época funcionava, existe humor e piadinhas, mas tbm existe comentário politico, tem a ação despirocada mas ainda tentavam criar um suspense e thriller investigativo (putz, realmente me lembram filmes do MCU, mas alguns dos bons, tipo Soldado Invernal) pode parecer estranho, mas esse equilíbrio entre tudo que já deu certo na franquia não deixava a era Bronsan genérica ou presa no passado, pois justamente pela repaginada moderna do fim do século XX, acabava criando uma identidade única, Brosnan não é um “Moore Turbinado”, é mais do que só outro Bond escapista, mas é tbm o Bond DEXcolado, da era digital, o Bond que dirige TANQUE sem amarrotar o terno, surfa, pula de Bungee Jump, um Bond que respeita as mulheres e até TRABALHA PRA UMA (enquanto isso o Nerdola tá aí chorando que a era Craig é “lacradora”, Bitch, please, Brosnan já problematizava James Bond a 20 anos atrás) um 007 que não fuma mais, e até comenta que é um “hábito horrível”, um bom moço por natureza que mesmo que ainda mate e transe bastante, agora faz isso de uma forma mais consciente… mais “PG13” vamos dizer assim
eu literalmente nem suo ou despenteio meu cabelo
claro que mesmo encarando como diversão escapista, a Era Brosnan ainda é uma montanha russa e oscila muito de qualidade até chegar no último e mais famigerado filme: “Um Novo Dia para Morrer”, a bagaceira que extrapola todos os limites aceitáveis de massaveísmo, a ponto de matar a franquia e fazer os produtores voltarem a buscar um caminho mais pé no chão com Cassino Royalle, quase o mesmo efeito que “Foguete da Morte” causou, com a diferença que Roger Moore continuou na franquia pelo menos…
Com uma trama rocambolesca que tem ditador coreano fazendo operação pra virar britânico, covil da Elza feito de gelo, carro invisível, satélite com raio laser, e o pior e jamais esquecido: o SURFE NA TSUNAMI! Die Another Day extrapolou toda a boa vontade da fanbase com a franquia, e decretou o reboot que estamos acompanhando até hoje.
De bom, só a música tema da Madona (e o clipe tbm, que sozinho é melhor que esse filme todo)
“kkk tô só seguindo o roteiro, não me julgue”
Pontos negativos:
depende do seu grau de envolvimento com cinema de ação massavéio, se você curtir, boa parte dos filmes pode ser agradável, se não, nenhum dos filmes vai agradar, nem mesmo o amado Goldeneye, já que este já começa com a cena do 007 conseguindo entrar e ligar um avião.. EM PLENA QUEDA LIVRE, se tu odeia “mentirada” desse naipe, afaste-se, prq esse tipo de situação resume a era Brosnan pro bem ou pro mal
“e vcs achando que Velozes e Furiosos era sem noção”
dito isso, o verdadeiro pecado real desta fase, é o filme “Die Another Day” em si, os outros filmes tem ideias ruins e absurdas? tem, mas só este concentra todas de forma tão imperdoável
e, eu não estava planejando isso, mas vou deixar Craig para uma parte 3, não só prq novamente ficou longo, mas prq queria aproveitar para falar um pouco dos “007 bastardos” tbm, e pra deixar o guia mais completo, como bônus eu vou fazer uma tabelinha com uma sinopse rápida de cada um dos 25 filmes, até breve
Um comentário em “Guia prático pra iniciantes em 007 (parte 2)”